20050919

Sobre o Corpo do Homem

O corpo é uma coisa que me interessa muito, principalmente o meu, que é o único que tenho: "Não existe senão um só templo no universo, e este é o Corpo do homem" (Novalis). Segundo afirmava Whilhelm Reich, "o corpo é o inconsciente do visível". Prefaciando o livro "O Corpo e seus símbolos" (Editora Vozes), de Jean-Yves Leloup, Roberto Crema diz: "o corpo é nosso texto mais concreto, nossa mensagem mais primordial, a escritura de argila que somos. É também o seu templo onde outros corpos abrigam." E complementa: "A pele é a ponte mais sensível do contato com o mundo e pode também ser o abismo. É o nosso orgão mais extenso, é o nosso código mais intenso, um lar de profundas memórias. O corpo sente, toca, fala, comunga...; Hoje sabemos o quanto nos desviou da saúde integral a concepção moderna que dissociou o corpo da alma e do espírito. Perdemos a coesão e a congruência; mais do que isso, também a transparência. A fragmentação epistemológica também refletiu no indivíduo e na sociedade, separando o organismo do meio ambiente, enfatizando as fronteiras e os conflitos. Alienação diabólica, já que diablos é o que divide. Por outro lado, Divino é o que vincula, unifica e restaura a inteireza vital.".
Eis aqui um exemplo do mestre Alberto Caeiro (heterônimo do magistral Fernando Pessoa), em versos parciais do grandioso poema "O Guardados de Rabanhos: (...) O meu olhar é nítido como um girassol./ Tenho o costume de andar pelas estradas/ Olhando para a direita e para a esquerda/ E de vez e quando olhando para trás.../ E o que vejo a cada momento/ É aquilo que nunca antes tinha visto,/ E eu sei dar por isso muito bem.../ Que tem uma criança se, ao nascer,/ Reparasse que nascera deveras.../ Sinto-me nascido a cada momento/ Para a eterna novidade do mundo...".
Segundo Roberto Crema, "Fomos modelados para a especialização." Só que esquecemos que "o especialista fechado é aquele que perdeu o olhar aberto, simples e natural. É alguém com a nuca rígida, que se considera onisciente, sem a flexibilidade de olhar para todos os lados, para cima, para baixo e para trás. É alguém com um viseira, cujos cacoetes adquiriram status. Neste olhar estreito e diminuto, o inusitado nos escapa. Perdemos o deslumbramento, o espanto essencial. No caminho viciado e repetitivo, a estagnação assassina o milagre do servir. Escapa-nos o poder inocente do arquétipo da Criança Divina. Na tumba do conhecido, nela padecemos, já não mais renascendo para a eterna novidade do mundo.".
Olhar para a realidade através de todas as suas possibilidades, utilizando todos os nossos sentidos e capacidades, sem confusão e opisição, sem nada negar ou idolatrar, esta é a verdadeira visão holística, onde tudo pode entrar, inovar e renovar, sem restrições de qualquer espécie. Somente assim, revigorados na dança do todo, é que poderemos evoluir do "cacoete" disciplinar da visão fechada para o "samba" da multiplicidade da visão aberta.
Neste seu livro, Jean-Yves Leloup convida-nos a resgatar toda a flexibilidade de nossas articulações, do corpo às psíquicas, numa jornada consciencial, da ponta dos pés à ponta da cabeça, numa ampla escuta do mais simples ao essencial, e entender mais concretamente o que é este nosso corpo, de homem, que é "o seu próprio livro de estudo, onde, basta ir virando as páginas, até encontrar o seu autor!".

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